Em um estudo recém-publicado, pesquisadores anunciaram a descoberta de mais uma versão do HIV: o subtipo L. Ele pertence ao grupo M do vírus causador da aids, que está por trás de 90% dos casos da doença no mundo.
“Revelar essa cepa é só o primeiro passo”, afirma Mary Rodgers, chefe do Programa Global de Vigilância Viral da Abbott, iniciativa responsável pelo achado. “Nós já compartilhamos sua sequência genética com a comunidade científica. Isso vai permitir que todos possam avaliar o seu impacto no diagnóstico, no tratamento e até em potenciais vacinas”, completa, em um vídeo disponibilizado para a imprensa.
Como assim? Toda vez que uma variação do HIV surge, há uma preocupação quanto ao seu potencial de resistir aos remédios e de não ser detectada pelos exames. Além disso, as vacinas que estão sendo desenvolvidas no momento precisarão considerá-la em seus testes de eficácia.
Daqui em diante, os especialistas devem justamente verificar essas questões. Segundo um comunicado da Abbott a respeito da pesquisa, os exames moleculares dessa empresa são capazes de flagrar o subtipo L do HIV.
Mas essa versão do vírus, originalmente identificada na República Democrática do Congo, pode ter desembarcado em outros países, inclusive no Brasil? “É sempre possível haver migração de vírus quando há migração de pessoas”, diz Mary.
Segundo o geneticista Amílcar Tanuri, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, isso só vai ser respondido com tempo e esforço dos experts. “Precisamos, por exemplo, verificar nossas amostras do HIV que não se encaixaram nos subtipos conhecidos anteriormente para checar se elas pertencem ao L”, arremata.
Essa é primeira vez desde 2000, quando diretrizes foram criadas para classificar os subtipos do vírus da aids, que uma nova cepa do grupo M do HIV é descoberto. “Até então, contávamos com outros nove subtipos dentro desse grupo e mais de 50 formas recombinantes entre eles”, ressalta Tanuri.
Pois é: quando infectam um mesmo indivíduo, as variações do HIV podem originar um vírus com trechos de um e do outro. Porém, em teoria, as formas recombinantes são mais fáceis de serem detectadas pelos exames porque carregam pedaços de inimigos já conhecidos.
Já o L é um subtipo puro, assim por dizer. Isso cobra uma dose extra de precaução com os estudos que avaliarão a partir de agora a eficácia dos antirretrovirais e dos métodos de diagnósticos contra ele.
Como os cientistas descobriram o subtipo L do vírus da aids
Ao contrário do que você pode estar imaginando, ele já existe desde os anos 1980. A questão foi realmente identificá-lo.
De acordo com as diretrizes de classificação de uma nova cepa de HIV, são necessários três episódios confirmados e independentes de infecção por um vírus “incomum” para estabelecer um subtipo adicional. No caso do L, os primeiros dois ocorreram nas décadas de 80 e 90 na República Democrática do Congo.
Já a terceira amostra de sangue foi coletada em 2001. A questão é que, na época, a quantidade de vírus presente no material era muito pequena. Isso impossibilitava o sequenciamento genético dele com as tecnologias disponíveis.
Com a evolução dos equipamentos e do conhecimento, os pesquisadores finalmente conseguiram mapear o DNA desse agente infeccioso e confirmar que ele era idêntico ao daqueles separados anteriormente. “Foi um trabalho muito interessante”, elogia Tanuri.
Do ponto de vista prático de diagnóstico e tratamento, nada muda por enquanto para a população em geral. O recomendável é seguir fazendo exames para diagnosticar precocemente o HIV e, se for o caso, seguir à risca o tratamento prescrito pelo médico. Em paralelo, devemos ficar de olho nas notícias para saber se o subtipo L exigirá algum cuidado especial.
Atualmente, 866 mil brasileiros convivem com o HIV, de acordo com o Ministério da Saúde. Só em 2017, 42 420 novas infecções foram contabilizadas.
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